domingo, 22 de setembro de 2013

Fazendeiros e grileiros fecham todos os acessos ao município de Luciara (MT)

Fazendeiros e grileiros fecham pista do aeroporto de Luciara com um trator
SÃO PAULO - O município de Luciara, no Mato Grosso, está sitiado desde a última sexta-feira. Todas as estradas e até mesmo o acesso à cidade pelo Rio Araguaia foram bloqueados por um grupo de fazendeiros e grileiros de terra que querem impedir a criação de uma Reserva de Desenvolvimento Sustentável, cujo processo está em andamento no Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). Duas casas foram incendidas - uma delas pertence a Rubem Sales, um dos cerca de 200 retireiros que apresentaram a proposta e que pertence à Comissão Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais (CNPCT) e a outra a Jossiney Evangelista da Silva.
- Estamos acuados dentro de casa. Dizem que vão queimar tudo e estão nos ameaçando de morte. Ameaçaram até mesmo minha irmã, que é professora - disse Sales, acrescentando que pneus foram queimados e um trator foi estacionado na pista do aeroporto.
O estopim para que o município fosse fechado foi a informação de que chegariam ao município dois pesquisadores para dar início ao processo de audiências públicas para criação da reserva. Os pesquisadores, porém, eram alunos de mestrado da Universidade Federal do Mato Grosso, e não estavam a serviço do ICMBio. O trabalho era associado às pesquisas do antropólogo Alfredo Wagner Berno de Almeida, que trabalha na identificação de comunidades tradicionais do Brasil, no projeto Cartografia Social. Os pesquisadores foram abordados por homens encapuzados e levados até uma localidade chamada Posto da Mata, a 100 km de distância, onde foram ameaçados para que não retornem mais ao local.
O presidente do ICMBio, Roberto Ricardo Vizentim, afirmou que de fato existe o projeto para criação de uma reserva de desenvolvimento sustentável de 100 mil hectares em Luciara. Segundo ele, a maior parte das terras pertence à União, pois é a várzea do Rio Araguaia.
A comunidade tradicional de retireiros - cerca de 200 famílias - usa a várzea nos períodos de vazante, como pasto para animais, quando as águas do rio baixam.
- O projeto está em estudo e não justifica de forma alguma uma ação deste tipo, que cria um estado de anomia, de ausência de normas e leis. Querem resolver na carabina. Existe sim viabilidade para criação da reserva, pois a maior parte das terras é da União, mas ela não será criada sem uma discussão com a sociedade, por meio de audiências públicas que sequer foram marcadas - afirmou Vizentim.
Padres e líderes comunitários ligados à Prelazia de São Félix do Araguaia também foram ameaçados pelo grupo de baderneiros, que são identificados como ligados a políticos e fazendeiros da região que também foram contrários à criação da Terra Indígena
Vizentim afirmou que é preciso assegurar a integridade física das pessoas e que não é possível que o estado do Mato Grosso sofra com uma situação como esta, de ausência absoluta do estado de direito. Segundo ele, as autoridades locais já foram acionadas para que tomem providências.
Paulo Maldos, da Secretaria-Geral da Presidência da República, afirmou que o Ministério da Justiça e a Polícia Federal também foram comunicados sobre a situação de Luciara, que fica a apenas 100 km de São Félix do Araguaia, onde equipes da Força Nacional também foram desafiadas durante os trabalhos de desocupação da terra indígena.
Os retireiros são os primeiros ocupantes não índios do Vale do Araguaia e também se dedicam à criação de gado, mas deslocam os animais entre pastos, o que impede a degradação da biodiversidade local. Na área de cerrado, eles mantém propriedades, mas as várzeas do rio, que pertencem à União, são usadas de forma comunitária por todos.
Para Vizentim, os grileiros buscam fórmulas para cercar as áreas da União para, depois, dizer que é deles. Depois de ocupar as terras, eles vão à Justiça reivindicar posse.

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